Tuesday, October 03, 2006

Os imbecis e o óbvio

Estava demorando um pouco, mas a tal ponto chegamos. Refiro-me a algo que (infelizmente) creio que muita gente pensa de mim: que dedico-me a reclamar das coisas. Na verdade, vai por esse caminho mas um pouco além. Referia-me mais especificamente a lançar uma espécie de carga negativa pro ar. Longe está isso de ser a minha intenção. Leia-se, portanto, tal texto como se fora uma espécie de alerta sobre uma actitude a evitar!

Há alguns meses, a minha mesa de trabalho ganhou um novo ocupante. Trata-se de um jovem mancebo. Um "boy" de vinte e poucos (isso soa muito velho de minha parte, mas já tenho a minha forma de escrever para lembrar-me disso). Até aí nada de mal. O problema é que aos dois dias na empresa, o garoto resolveu mostrar que tinha carácter. [O detalhe é que eu não falo com o meu "colega" imediatamente ao meu lado na mesa] Eis que ele dirige-se ao meu vizinho e manda algo como "não sei onde as pessoas vêem tanta genialidade em (Verner) Panton" [Designer-ícone Dinamarquês] e continua, "tudo o que ele criou eram resultados óbvios dos métodos de producção que ele adoptava"...

Ao ver que o meu vizinho (e ex-companheiro de faculdade) resumia a sua resposta com um "Não curto falar de Design. Prefiro política, porque trata de pessoas", vejo que mesmo contra a minha vontade, não poderia deixar passar tal blasfêmia em branco. [O detalhe desta vez foi esse energúmeno pensar que existe algum aspecto do (bom) Design que não "trate de pessoas". Além do mais, ele é um completo fascista!]

Nisso, contesto em forma de pergunta (pois não queremos impingir nada a ninguém, para além do que, é sempre melhor quando expomos um arrogante à sua própria ignorância) algo como, "Óbvio quando? Para quem?". Consternado, o rapaz pergunta-me o que eu queria dizer com aquilo. Vendo que a conversa teria potencial para monólogo, decido que há coisas que não cabe a ninguém ensinar a certas pessoas. Algo como meter um dedo numa tomada. Por mais que alertem, só aprendes bem quando o fazes. Respondo então com um simples "Se calhar, aí reside a genialidade desse senhor! Ele conhecia tão a fundo os processos que utilizava, e isso na época da criação de tal método de producção (estamos falando aqui de mobiliário em plástico), que talvez tenha chegado mesmo a definir os seus 'limites' ou características que lhe definem ao dia de hoje". Ficou subentendido um "para que arrogantes como você acreditem-se gênios".

Não me recordo do que seguiu-se, mas lembro bem que não durou muito. Recebí uma pergunta evasiva como resposta, referente a algo congênere mas não directamente similar ao tema que discutíamos. Talvez uma técnica aprendida num desses livrinhos de blefes, que se vende por toda parte. Daí pude ver que "o" personagem em questão era um daqueles fogos de palha, recheados de trunfos(bombinhas) na manga, prontos a ser distribuídos, destinados a ganhar uma discussão. Já há muito, abandonei a cidade onde viví quase toda a minha vida (ao dia de hoje, isto resume-se a 2/3 da mesma), por crer-me farto desse tipo de gente. Tyler Durden diria "gente que não escuta e tão-somente espera o seu turno para falar". Com isso, resolví mergulhar no meu aquário, desta vez, projectando diante de um monitor, e não vagando pelas ruas da cidade.

Antes irritava-me profundamente cruzar com pessoas que emitiam expressões como "evidente", "claro" ou "óbvio" (sem dúvida, a mais enervante). Ultimamente, no entanto, tento ver tal coisa como uma espécie de filtro. Isso revela o tipo de personagem a assumir enquanto resolva participar de qualquer discussão. Normalmente, sei que em tais situações passo por tonto, mas o que pensam de mim já não me importa tanto. O grau de dano que isso me possa causar é directamente proporcional ao nível de proximidade (pessoal) com aquele(a) que o profere. Assim, sei que tenho uma boa margem de escudo: minha ilha segue à deriva.

[Creio que o texto ficou por concluir, pois muito ficou por dissertar por aqui, mas como não acredito em absolutos (não sou um Sith), e não tenho (nem acredito) em "verdades de ouro", ou "palavra de rei", deixo a ponta solta, à espera que o vento traga-me mais linhas para os remendos...]

5 comments:

Evz said...

Uma das vertentes a dirigir o texto seria a implementação dessa lógica com o intuito de descolar mulheres. Sendo "cabeça", isso também teria a ver com saber quais seriam as perguntas certas, mais que as respostas.

Como diria um tal Paul Hewson: "We thought that we had the answers, it was the questions we had wrong".

Evz said...

Confesso que hoje o "pensamento não-linear, segue, para dentro..."

Evz said...

O pensamento, seu boiola! Isso aqui é uma birosca de nível, pô! ;)

Roberto Mello said...

Só mesmo dois neocybernerds como vcs pra ficar usando isso aqui de chat! :D

Meus comentários.

Meu método de lidar com imbecis sempre foi o "Socrático"... Começar a perguntar a ponto dos caras verem o tamanho da merda que estão falando. Já oscilei por um tempo, querendo me afastar de discussões com imbecis ou não, mas há pouco decidi simplesmente falar quando estiver a fim ou não. Antes só falava se achasse que fosse mudar o imbecil. Agora eu falo quando eu quero. Simples assim. Se tiver público melhor ainda. Pq nada melhor do que desmascarar um imbecil.

O que eu não gosto, em absoluto, é ter diálogos em que nossas conversas "quicam" na outra pessoa, vão e vem absolutamente da mesmo maneira, sem o mínimo de acréscimo/modificação do outro intelocutor.

E pra deixar claro, acho que se tornar uma ilha, há muito se mostrou mais do que errado pra mim. Não resolve absolutamente nada e se perdem oportunidades de se conhecer muito gente que acrescenta, no meio do mundo de merda. Isso tá funcionando pra mim, estar "aberto". Pra mim. Que não seja uma verdade universal.

Evz said...

O ser uma ilha não é opção, no meu caso, mas tem sido até aqui uma espécie de única via possível. Tento mudar.